quarta-feira, junho 20, 2012

Guerra na Blogosfera Econômica


Nessa semana, estourou a maior guerra na blogosfera brasileira dsde que eu a acompanho. Tudo começou quando o Reinaldo Azevedo, o mais polêmico colunista da VEJA, resolveu descer a lenha em uma pesquisa de um internacionalmente respeitado professor da PUC-RJ que procurava identificar efeitos do programa Bolsa-Família sobre a redução da criminalidade em São Paulo. Em resumo, o estudo conclui que o programa é responsável por 21% da redução dos índices de criminalidade da cidade. O jornalista, no entanto, não aceita que um estudo desse porte use como amostra apenas a cidade de São Paulo - já que no Nordeste está a maior parte dos beneficiados e lá a violência segue trajetória ascendente na última década - e que não tenha levado em consideração as políticas de segurança pública adotadas na capital paulista no período abordado.

Todavia, em sua crítica, Reinaldo Azevedo deixou claro que não leu o artigo científico em seu formato original, detendo-se nas conclusões apresentadas em uma reportagem de O Globo. Contudo, utilizou (ainda que implicitamente, é bom ressaltar) como estratégica de retórica a chamada "falácia do espantalho", que consiste em distorcer os argumentos do adversário no debate de forma a torná-los muito piores do que realmente são. Assim, o professor João Manuel Pinho de Mello não apenas teria se equivocado na escolha da base de dados e do método estatístico, ou que teria tirado conclusões mais ambiciosas do que as evidências empíricas encontradas permitiam, mas também teria o objetivo de favorecer politicamente o PT nas próximas eleições municipais, dando crédito a uma importante questão política da cidade (a segurança pública) a um programa do governo federal, e não às medidas dos governos estadual e municipal. Além disso, o jornalista utilizou uma linguagem ácida, que se considerada divertida quando direcionada a políticos e militantes, é tida como desrespeitosa na comunidade acadêmica. Resumindo, o problema não era que a pesquisa era falha, mas sim que o pesquisador era mal-intencionado. Tudo isso foi agravado pelos comentários (anônimos na maioria) dos leitores do Reinaldo Azevedo: demonstrando total ignorância sobre pesquisas científicas, passaram a atacar como "braços da agenda petista de dominação nacional" não apenas o estudo em questão e o seu autor, mas também a PUC-RJ como instituição e a própria academia brasileira, sem ressalvas a questões de vertentes teóricas e métodos.

O resultado não podia ser outro: um levante geral na blogosfera econômica em apoio ao professor da PUC-RJ. A única ressalva foi o "O Anônimo", do blog A Mão Visível, que se deteve em problemas técnicos da pesquisa em questãoO mais intereressante é que a maior parte dos "econoblogueiros" indignados com o comportamento do jornalista  não são os petistas, mas sim os liberais e ortodoxos, que não gostaram de ver o seu instrumento de trabalho - a econometria - ser atacado publicamente por um leigo. Além disso, o professor João Manuel Pinho de Mello publicou uma carta de resposta ao jornalista em que esclarece os detalhes de sua pesquisa. No entanto, no início desse documento o autor destaca a sua carreira acadêmica - títulos, pesquisas anteriores, artigos publicados, etc. - como forma de demonstrar sua superioridade intelectual em relação ao oponente, além de provar que não faz proselitismo ideológico petista. Sabe-se que, dentro de um ambiente acadêmico, tudo isso é fonte de respeito e consideração. Contudo, mesmo ponderando-se que o professor escreveu o documento de cabeça quente, para o público em geral, isso pode demonstrar pedância. Ou seja, tentou-se usar pólvora para apagar a fogueira.

O Drunkeynesian - o melhor blog de economia em português na minha opinião - descreve o dia-a-dia das batalhas aqui.

Mais tarde pretendo voltar a essa discussão.

segunda-feira, junho 18, 2012

Uma Partida de Civilization II de 10 Anos

Um dos maiores vícios da minha junventude é o jogo de computador Civilization II. Ganhei ele de Natal da minha avó em 1997, e ainda atualmente o jogo às vezes quando bate uma saudade. O software é, em resumo, um simulador da história mundial, em que o jogador lidera uma civilização do ano de 4.000 A.C. até o ano de 2.000 D.C., e, em sua trajetória, coopera e - principalmente - compete com outras civilizações controladas pelo computador. O vencedor do jogo é a civilização que dominar as demais, seja militarmente (pela conquista mundial), seja tecnologicamente (por ser a pioneira na exploração espacial). Além disso, é possível jogar cenários históricos, que são facilmente encontrados para download na internet, e é o que eu mais aprecio pessoalmente.

Hoje, li na internet que um outro viciado está jogando a mesma partida há 10 anos, e não pretende desistir tão cedo. Segundo o simulador, como seria o mundo no ano 4.000 D.C.? A resposta está no mapa abaixo:



Segundo o jogo, o futuro da humanidade não é nada animador. As características do mundo são as seguintes:

- Três civilizações dominam o mundo, e estão em eterna guerra entre si. Uma, a do jogador humano, é uma ditadura comunista. As demais, controladas por inteligência artificial, são teologias fundamentalistas. A guerra permanente inviabilizou governos mais abertos.

- As armas nucleares provocaram o derretimento das calotas polares, transformando o mundo em um grande pântano (com excessão das áreas montanhosas). A agricultura se tornou impraticável, 90% da população mundial morreu de fome, e as grandes cidades viraram coisa do passado.

- Toda a produção das cidades é voltada à guerra e à construção de estradas para as tropas passarem. Nenhuma melhoria de infra-estrutura é viável.

Contudo, para não deixar o post fatalista, faço duas observações pertinentes, relacionadas ao realismo do jogo.

Em primeiro lugar, no Civilization II original, tal como eu ganhei em 1997, a ênfase da competição entre as civilizações era o domínio tecnológico. As partidas eram mais pacíficas, e os protagonistas mais cooperavam   (via trocas de pesquisas, alianças, etc.) do que se enfrentavam em guerra. Na década seguinte, no entanto, os desenvolvedores do jogo criaram uma versão tida como mais "emocionante", em que a inteligência artificial do simulador se tornou extremamente hostil e belicosa. Tão logo atingem a Revolução Industrial, as civilizações controladas pelo computador tendem a adotar regimes fundamentalistas e atacar todos os demais adversários. Essa é a única versão do jogo compatível com Windows Vista e Windows 7, e a jogo desde 2007.

Em segundo lugar, o Civilization II se baseia no princípio que o "motor do desenvolvimento" é o crescimento populacional. Conforme a população de uma civilização cresce, ela aumenta a produção, cria trabalhadores, faz obras de infra-estrutura e pesquisa tecnologia de modo a aumentar a produtividade. Segue mais ou menos uma lógica marxista: o trabalho humano é o único fator de produção. E isso vale durante o jogo inteiro, com uma aceleração brusca da produtividade quando a população atinge a industrialização. Por isso, para uma civilização crescer, é necessária a contínua conquista de novas terras para a construção de novas cidades e a ocupação do solo para atividades agrícolas. Se o algoritmo do jogo fosse aberto para outros fatores de produção, como a acumulação de capital privado, o capital humano e o desenvolvimento endógeno de tecnologia, o resultado poderia ser bem diferente.

PS 1: Observo que na macroeconomia moderna, o modelo unificado de crescimento de Galor admite que a importância dos fatores de produção para o desenvolvimento das economias varia de acordo com o tamanho do produto. Assim, em sociedades primitivas, o crescimento populacional de fato é o motor do crescimento econômico. Contudo, quando o produto atinge um determinado patamar, o processo de acumulação de capital baseado em poupança e investimento assume o seu lugar, e, mais para a frente, o desenvolvimento tecnológico e a sua incorporação pelas pessoas se tornam mais relevantes. Por isso, o jogo pode ser resumido a uma simulação sobre o que aconteceria se bárbaros tivessem armas modernas.

PS 2: Durante um tempo, tentei jogar o Civilization Call to Power, uma continuação da série, que inclui aspectos mais complexos do desenvolvimento das sociedades. Mas achei tão complexo que ficou chato.