quarta-feira, abril 26, 2006

Teoria do Federalismo Fiscal

Mais um sub-capítulo da minha monografia de conclusão de curso, para o interesse geral.

1.1.3. Teoria do Federalismo Fiscal

Os estudos de natureza econômica referentes à questão do federalismo buscam compreender as articulações políticas e institucionais entre o governo federal e os governos subnacionais, buscando arranjos de distribuição intergovernamental de fundos públicos. Em outras palavras, a abordagem econômica do federalismo busca estudar a distribuição de competências referentes às receitas, tributárias ou de transferências, e aos gastos públicos delegados entre as esferas de governo, dentro de cada federação.

Nesse sentido, a teoria do federalismo fiscal é um ramo da teoria econômica do setor público, e é voltada para o estudo da repartição de competências fiscais entre diferentes instâncias de governo, de modo a maximizar a eficiência das provisões de recursos para os governos, e de oferta de bens públicos para a população. Conceitualmente, pode-se definir a teoria do federalismo fiscal como o estudo de como um Estado nacional se organiza em diferentes esferas de governo de modo a buscar a alocação eficiente de recursos para a oferta de bens públicos. O objeto da teoria do federalismo fiscal não se restringe à alocação de recursos públicos, mas se estende às atribuições intergovernamentais referentes às políticas de distribuição de renda e de estabilização macroeconômica.

Sabe-se que nem todos os bens públicos tem impactos espaciais semelhantes, o que faz com que os governos locais tenham vantagens comparativas em administrar serviços públicos de abrangência territorialmente restrita, tal como é o caso dos serviços de limpeza urbana. Além disso, é notável que os governos locais, por terem maior volume de informação sobre o seu eleitorado, identificam melhor as preferências de sua população em relação à demanda desta por bens e serviço públicos. E ainda, a descentralização das competências administrativas permite a diversificação dos métodos de elaboração de políticas públicas em um país, podendo dar maior destaque às mais eficientes perante a opinião pública. Por fim, a descentralização permite uma redução do aparato estatal federal da nação, o que proporciona maior eficiência para o seu setor público como um todo.

Além desses objetivos de natureza econômica, o federalismo fiscal também é estudado pelos seus benefícios do ordem política que proporciona aos países. Principalmente, devido à possibilidade de instituir-se mecanismos institucionais de controle mútuo de poder entre as esferas de governo, como os “checks-and-balances” norte-americanos. Tais mecanismos de controle acabam por fortalecer as instituições democráticas e do Estado de direito da nação. E ainda, a maior proximidade entre os cidadãos e as autoridades governantes, obtida com a descentralização, proporciona uma maior transparência para as atividades políticas em nível nacional.

sábado, abril 22, 2006

Sobre as Revoltas Estudantis na França

Relativamente às manifestações dos jovens franceses contra a polêmica lei do emprego para jovens, que incentiva a contratação minimizando os direitos dos trabalhadores para as empresas, vemos, na mídia e na opinião pública, um verdadeiro massacre. Que a revolta é conservadora, que a revolta é comunista, que expressa uma "aversão ao trabalho", que fará a França crescer menos, que as empresas francesas se deslocarão para a China, entre outros argumentos.

Em uma abordagem menos ideologicamente parcial, vemos que a coisa não é bem assim - e que as manifestações, que juntaram milhões de jovens trabalhadores, tem uma lógica racional.

Em primeiro lugar, deve-se lembrar que o governo conservador da França, liderado por Jacques Chirac, foi eleito com cerca de apenas 25% dos votos. Ou seja, não tem legitimidade suficiente perante à sociedade francesa para tentar realizar reformas sociais polêmicas. Em nome da responsabilidade política, o governo deveria ter se dado conta disso.

Em segundo lugar, a segurança é um bem público, isto é, a sociedade demanda segurança para seus governantes. Se as empresas têm o direito de demitir livremente e sem indenizações seus trabalhadores, o impacto na vida destes, caso venham a ser demitidos, justifica a sua oposição à lei. Concordo que legislações trabalhistas muito rígidas, que tratam os empregadores como "exploradores" natos, tendem a espantar o espírito empreendedor no país, já que apenas as grandes empresas podem contar com um corpo de advogados apto o suficiente para enfrentar os seguidos processos trabalhistas, e informalizar a economia. Contudo, a indenização ao trabalhador dispensado antes do término do seu contrato é um direito inalienável, pois ajuda a manter um padrão de vida mínimo garantido para todos os cidadãos, o que, se não é economicamente eficiente, na ótica do equilíbrio geral paretiano, é moral e civicamente justificável.

Por fim, os países ocidentais vem desregulamentando o seu mercado de trabalho e cortando direitos dos seus trabalhadores como modo de evitar fuga do seu capital produtivo para países de tradição institucional autoritária, como a China. Nesses países, as massas são vistos como meros instrumentos de manobra de seus guias, isto é, de seus governantes, que se julgam saber o que é melhor para seu povo, incluindo suprimir seus direitos mais básicos, independentemente das opiniões deste. Tal ideologia política é absolutamente incompatível com os princípios democráticos dos países ocidentais, o que significa um limite político claro à desregulamentação do mercado de trabalho nesses países.

Já é hora de as instituições políticas e econômicas internacionais, como o Banco Mundial e a ONU pressionarem os países autoritários a elevarem os níveis de direitos humanos, liberdade e bem-estar social de suas populações, como modo de evitar que as condições de trabalho no mundo se nivelem pelo nível mais baixo, como vem acontecendo no mundo nos últimos vinte anos.

sexta-feira, abril 14, 2006

Por Que Estudar o Federalismo?

Estou bastante ocupado com minha monografia de conclusão de curso. O tema, pra variar, é o federalismo fiscal, assunto que já venho trabalhando a três anos. Mais especificamente, a relação da dinâmica do federalismo fiscal instituído no Brasil com as políticas de desenvolvimento regionais executadas desde a Constituição Federal do Regime Militar.

Muitos colegas me perguntam qual é a relação entre federalismo fiscal e ciência econômica. Esse assunto não estaria mais próximo da ciência política ou do direito público? Para os incrédulos, respondo suas dúvidas com os primeiros parágrafos já concluídos da minha monografia:


1.1.1 Federalismo e Teoria Econômica - Aspectos Conceituais

Na atualidade, a questão do federalismo e da distribuição e descentralização intergovernamental de competências políticas deixou de ser objeto de estudo quase que exclusivo do Direito Constitucional, e cada vez mais vem atraindo o interesse de diversos outros ramos das ciências sociais, como a Economia, a Ciência Política e a História, em relação a pesquisas e estudos aplicados. De acordo com a bibliografia sobre o tema, tal interesse deve-se, sobretudo, à atual tendência internacional de fortalecimento da integração de blocos econômicos regionais[1], em que conjuntos de Estados nacionais abrem mão de parte de sua soberania para dar lugar a uma instituição de poder supra-nacional, capaz de conciliar os interesses das unidades constituintes.

Além disso, deve-se destacar a própria estrutura socioeconômica das principais federações existentes presentemente. Geralmente, são países democráticos, com grande dimensão territorial (como o Brasil, os Estados Unidos e o Canadá), populacional (como a Índia) e econômico (como os Estados Unidos e a Alemanha), que buscam, pela descentralização das competências políticas, uma maior aproximação dos cidadãos aos seus representantes, de modo a favorecer uma melhor compreensão por parte destes sobre as preferências políticas e as demandas do eleitorado em nível regional e local, assim como uma maior fiscalização da administração pública pelos cidadãos. Além disso, pelo fato de que a maioria das federações enfrenta situações de heterogeneidade populacional, de natureza socioeconômica ou cultural, autores de diferentes formações dentro das ciências sociais consideram os arranjos federativos como mecanismos para os grandes países preservarem democraticamente a sua integridade nacional.

Outros autores ainda destacam o papel do desenvolvimento e a expansão dos meios de comunicação para a maior eficiência das políticas de descentralização, já que tanto os governos como os cidadãos têm cada vez maior volume de informações ao seu dispor.

Uma federação pode se formar de duas maneiras. Pode ser o resultado de uma centralização de poder em um Estado formado pela união de unidades políticas autônomas, como é o caso dos Estados Unidos, formado pela união das treze colônias britânicas na América do Norte. Ou então, pode ser o resultado da descentralização de poder em Estados nacionais unitários, tal como aconteceu na Alemanha e no Brasil.

Em suma, o federalismo é um ideologia política, isto é, consiste em um conjunto de idéias combinadas, relativas ao exercício do governo em um determinado território. Sabendo-se que, para melhor estudar como um Estado é governado e como o mesmo influi na economia e na sociedade a qual pertence a qual pertence, é imprescindível que se considere os arranjos institucionais[2] vigentes, incluindo o conjunto de leis, políticas e práticas pelos órgãos públicos, institucionalmente, o federalismo caracteriza-se pela coexistência de diferentes esferas de governo dentro de um determinado país.

Segundo autores como Fernando Luiz Abrúcio (2000), o federalismo consiste em um arranjo político com uma dupla soberania[3]. Isto é, governam juntos, em um dado território nacional, um conjunto de governos subnacionais, que contam com autonomia e com capacidade de auto-organização, auto-governo e auto-administração, responsáveis em atender ao eleitorado local, e um governo federal, representante de todo o país. As competências políticas e administrativas tendem a ser descentralizadas, sendo que as atribuições delegadas a cada esfera de governo são definidas por uma Constituição Federal. Contudo, a descentralização de competências entre esferas de governo exige a existência de um sistema tributário descentralizado, de modo a proporcionar a cada instância de governo o volume de recursos necessários para cumprir com suas obrigações.

Em relação ao pacto federativo, isto é, ao acordo entre as partes federadas que dá a origem e a forma à federação, sua conceituação é discutida por duas correntes de autores. Segundo uma dessas correntes, o pacto federativo é um pacto político, que define o poder e a autonomia de cada esfera governamental dentro de um Estado nacional. A outra corrente, à qual se insere Arnaldo Madeira (2000), defende que o federalismo é o resultado de uma toda uma engenharia política, fruto da barganha entre interesses locais e federais. Por isso, a construção de um pacto federativo deve ser feita de modo a se adequar com as instituições e as características sócio-culturais ao país ao qual pertence. Além disso, as formas institucionais que uma federação pode assumir são variadas, de acordo com questões geográficas, culturais e históricas específicas a cada nação.

[1] Sendo que a União Européia constitui no exemplo mais notável mundialmente.

[2] O conceito de instituição mais comumente adotado pelos artigos científicos sobre o tema é o de Douglas North, para quem “as instituições constituem as regras do jogo numa sociedade; mais formalmente, representam os limites estabelecidos pelo homem para disciplinar as interações humanas. Conseqüentemente, e em compensação, estruturam incentivos de natureza política, social e econômica.” (NORTH, 1998, pg. 7).

[3] Todavia, a maioria dos autores considera “dupla soberania” um termo demasiadamente radical, já que há limites explícitos para a atuação de cada esfera de governo dentro do território de uma federação

domingo, abril 09, 2006

Review - Black Sabbath (Black Sabbath)

O que dizer de um dos maiores clássicos da história do rock? É simplesmente uma obra-prima da técnica musical.

Vamos contextualizar historicamente: o ano é 1970. O mundo vive a euforia do paz e amor, a ideologia hippie, globalmente difundida por astros como os Beatles, Simon & Garfunkel e Janis Joplin. Porém, em uma cinzenta e fria cidade industrial do interior da Inglaterra - Birmingham - quatro jovens muito pobres, sem ter muito o que curtir na vida, também resolvem fazer o seu som. Só que, ao invés de tocar o alegre rock'n'roll e o suingado rythm'n'blues, que eram os ritmos mais populares na época, os quatro rapazes preferem expressar os seus sentimentos no ritmo triste do blues, com infuência marcante dos riffs de guitarra pesados, à la Jimmy Hendrix. "O Black Sabbath veio para acabar com essa porcaria de paz, amor e felicidade", disse uma vez John "Ozzy" Osbourne, vocalista da banda.

São raros os compostitores (e artistas em geral) que conseguem fazer da sua própria criatividade um novo estilo de expressão. E o Black Sabbath, com o mix entre blues, rock'n'roll e guitarra pesada que se consagraria nos discos posteriores, muito mais do que ter fundado pessoalmente o Heavy Metal como estilo musical, tornaram-se os ícones de um novo estilo de vida, uma espécie de resistência melancólica à euforia dos anos 60 e 70.

O primeiro disco do Black Sabbath, com o mesmo nome da banda, foi gravado em 1970, e conta com grandes destaques dentro do universo não apenas do rock pesado, mas de toda a música popular contemporânea internacional. O disco começa com sons de chuva e sinos, entrando em seguida um riff lento e pesado, clássico pela sua simplicidade (mizão, mi um oitavo acima e slide entre lá sustenido e lá). A música, em seguida, torna-se mais lenta e com ritmo abafado, enquanto Ozzy Osbourne canta descrevendo, de maneira sombria e melancólica, um ritual satânico. Essa é a música Black Sabbath, inspirada em um filme de terror, que deu nome à banda e ao disco.

A segunda faixa é The Wizard, um blues quase alegre, comparando com as demais faixas do disco. A frase de gaita de boca tocada por Ozzy Osbourne tornou-se famosa, assim como os solos de Tony Iommi. Nessa faixa é bastante notável a criatividade rítmica do baterista Bill Ward, fazendo batidas não-convencionais para o rock e o blues da época, o que se tornou uma das marcas registradas da banda.

O disco prossegue com Behind the Wall of the Sleep, um blues com melodia psicodélica, e que conta a história de uma flor cujas "pétalas tem um estranho poder", provavelmente inspirada na heroína. A música tem uma base de guitarra bastante agradável de se ouvir e de se tocar, e ainda conta, no final da faixa, com um solo de baixo de Geezer Butler.

A quarta música é N.I.B., um rockzão com um riff de guitarra muito pesado (a distorção usada pelo guitarrista Tony Iommi, de equipamento muito antigo, dá um chiado bastante característico à musica). A letra não é nada menos que uma declaração de amor de Lúcifer a uma mulher. O rock'n'roll continua com Evil Woman, a música mais simples do disco.

Mas o grande destque do álbum são a sexta e a sétima faixas (Sleeping Village e The Warning), que são emendadas uma na outra. Sleeping Village começa com um dedilhado acústico, e com quatro versos cantados tristemente por Ozzy Osbourne. Os demais três minutos de música são puras demonstrações de técnicas de guitarra por Tony Iommi. A última frase de guitarra da música já emenda em The Warning, que é um blues de bela melodia, e com a letra mais sentimentalmente profunda do disco. Essa faixa, diga-se de passagem, tem nada menos que onze minutos de música, sendo que três de versos cantados, e oito minutos da pura criatividade De Tony Iommi e Bill Ward, demonstrando sua perícia em riffs de guitarra pesados, solos com grande harmonia, e influências do blues, do rock'n'roll de da música country, ao passo que o baterista parece sempre inventar novos ritmos e batidas. Tudo isso pode parecer normal, se não fosse o fato de que os integrantes da banda tinham em torno de vinte anos quando compuseram isto! E ainda, como Tony Iommi havia perdido as pontas dos dedos em um acidente, toca usando próteses de metal, o que dá uma sonoridade toda especial aos seus trabalhos. É de uma perícia e uma criatividade musical indescritível, nunca igualada no rock internacional posterior (mesmo os guitarristas com formação de música clássica, como Yngwie Malmsteen não possuem o mesmo feeling sentimental de Tony Iommi, e nem a sua personalidade).

A última faixa é Wicked World, a mais rápida do disco, e que conta com um vocal estranho do Ozzy, muito mais agudo que o natural.

Depois desse disco, o Black Sabbath continuou misturando blues com rock e guitarras sujas, mas cada vez mais se orientando em direção a um estilo próprio, pesado, melodioso e com batidas alternativas, que foi denominado Heavy Metal pela crítica, em homenagem às antigas cantigas de guerra do exército britânico. No final dos anos 70, o heavy metal recebeu influência do punk rock, e tornou-se rápido (estilo Iron Maiden e Judas Priest) como conhecemos hoje em dia, ao passo que no início dos anos 80 fundiu-se com o glam rock, e tornou-se bem mais comercial e alegre (exemplo clássico é a carreira solo de Ozzy Osbourne). Em reação ao glam rock, surgiu nos Estados Unidos o trash metal, liderados pelo Metallica, bem mais pesadão, que vigorou até cair no ostracismo do final dos anos 80. Na década de 90, quem dominou (e ainda domina) é o metal melódico europeu, com um mix de rock pesado e música clássica, ao passo de que nos Estados Unidos predomina o new metal, influenciado pelo rap.

Ou seja, quase quarenta anos se passaram e o heavy metal mudou muito. Mas nada que se compare à criatividade dos quatro rapazes pobres e desempregados de Birmingham que queriam montar uma banda de blues para cantar suas tristezas.

OBS. Eu comprei esse disco em Janeiro de 2003, por 10 reais em uma liquidação na Multisom de Torres. Baita sorte.

terça-feira, abril 04, 2006

As Minas do Rei Salomão - Henry Rider Haggard

É notável a tendência, nos últimos séculos, que os escritores de ficção têm de buscar lugares mágicos para ambientar suas histórias, como forma de fugir do ambiente monótono e racionalístico em que o autor e os leitores vivem. Nas últimas décadas do século XX, o lugar preferido dos autores de ficção, seja de livros, seja de cinema, é o espaço sideral, um infinito longe da realidade social humana. Já no final do século XIX, enquanto que a Europa se consolidava ao mesmo tempo a Segunda Revolução Industrial, tornando as paisagens urbanas cinzentas, frias e artificiais (no sentido de ser algo fora da natureza) e o processo que Max Weber denominou de "desencantamento do mundo", isto é, a racionalização e a burocratização de todas as relações humanas, os autores de ficção "escapavam" de suas realidades para o mundo selvagem, não-europeu, não-industrial.

Fugir da realidade. Fugir da racionalização excessiva das instituições humanas. Buscar o mágico, o inexplicável, o fantástico que povoa as mentes humanas desde os tempos imemoriáveis. Chega de determinismos superficiais, análises psicológicas e generalizações patológicas, que tanto povoaram a literatura real-naturalista internacional na segunda metade do século XIX. Vamos buscar a natureza, nos encontrarmos como os bons selvagens, em completa liberdade, que éramos antes de sermos dominados por esta prisão chamada de civilização. Esta é uma síntese do pensamento romântico, que influenciou diretamente os contos fantásticos do final do mesmo século.

As Minas do Rei Salomão, de Henry Haggard têm como principais personagens figuras idealizadas no melhor estilo primeira geração romântica: um explorador destemido, exemplo de força e de coragem (Allan Quatermain), um lorde inglês, herói nacional (barão Curtis), um perfeito gentleman vitoriano (capitão John), e um misterioso príncipe africano. Porém, mais importante que todos essas figuras, o principal personagem do livro é a África, o continente selvagem, misterioso, algo como puro, em relação à civilização. Todas as descrições ambientais, com a exceção do deserto que os personagens têm que atravessar logo no início da narrativa, tem algo de paradisíaco: oásis, savanas, animais colossais, aventuras, enfim, a liberdade.

A história central do livro, diga-se de passagem, é totalmente fantasiosa. O barão Curtis e o capitão John contratam o caçador de elefantes Allan Quatermain para explorar as montanhas do centro da África, com o objetivo de encontrar uma arcaica colônia fenícia onde o rei Salomão, de Israel, havia guardado os seus tesouros, incluindo diamantes gigantes. É algo tão absurdo que não vale a pena nem tentar explicar. Além disso, para leitores do século XXI acostumados com a febre do politicamente correto, a narrativa parece preconceituosa com os costumes dos nativos africanos, descritos como superticiosos, arrogantes e indolentes. Contudo, não se pode esquecer que a história foi escrita por um inglês da época vitoriana, o auge do Imperialismo Britânico e do orgulho que acarretou para os cidadãos. Ou seja, na verdade, não há uma rejeição do caráter africano, mas sim uma super-estimação dos personagens britânicos.

O livro, em suma, é uma boa recomendação para quem quer deixar de lado os problemas da vida por um momento e sonhar, viajar para uma terra distante e fantástica.